segunda-feira, 13 de julho de 2020

A tradição dos TAPETES DE FLORES na Ilha da Madeira

A tradição dos TAPETES DE FLORES na Ilha da Madeira 




A música, a gastronomia e as ornamentações distinguem um dia festivo, uma romaria, uma procissão, de um dia comum na vida do madeirense. É tradição na ilha da Madeira avistarem-se, mesmo de longe, ornamentações florais, rico colorido que acompanha a linha reta ou curva dos caminhos, ruas, ruelas e becos – são os longos tapetes florais, autênticas passadeiras de flores naturais, que mãos humanas constroem, em formas tendencialmente geométricas, montadas através de moldes de madeira ou cartão duro, que funciona como um módulo, cujos espaços abertos são ocupados com flores, pétalas, musgos, verduras, revelando uma organização / composição em forma de padrão, por vezes assimilando-se a um arranjo floral ou empiricamente a uma forma fractal, como se encontra na Natureza (divisão e repetição rigorosa de formas). 


A feitura dos tapetes de flores resulta de um trabalho organizado por vizinhos, amigos, familiares, paroquianos, fregueses ou até por instituições das localidades. Se as cidades hoje aderiram a esta tradição, a verdade é que a sua raiz tradicional é, basicamente, rural, e quase sempre com relação direta a práticas religiosas, daí que surgem, alternadamente, e extravasando a largura do tapete, representações alusivas à Igreja, como a cruz de Cristo, o cálice, a hóstia, estrelas, corações, cordeiros, monogramas, etc. Os tapetes assumem relevância na marcação de itinerários por onde passam as procissões, bandas filarmónicas, comunidades / instituições paroquiais e multidões (gentes de fé ou simples curiosos). Destacam-se os tapetes florais para as festas em louvor do Santíssimo Sacramento, com solene ritual. Sobre o tapete passa o sacerdote, sob um pálio, transportando e exibindo uma custódia, normalmente dourada ou de prata dourada, a mais rica e moderna da igreja, com o Santíssimo Sacramento. A ladear o tapete seguem-se as bandeiras, pendões, anjos, irmãos das confrarias, festeiros, fiéis cumprindo promessas, banda de música e o povo. Mas semelhante ritual repete-se, por vezes, em outras festas de acordo com o orago das igrejas, embora de maior simplicidade. Recorde-se, ainda, por exemplo, a passagem da imagem de «Nossa Senhora de Fátima», na Madeira, em 1948, onde ruas foram atapetadas com flores. 


Para a construção dos tapetes de flores, a população local, nas vésperas das festas, e organizada por grupos, recolhe flores silvestres nas serras madeirenses, mas também conta com as flores plantadas nos jardins privados, e mais recentemente recorre a plantações realizadas de propósito para a construção dos tapetes, revelando uma organização atempada e até certa competição entre sítios e freguesias para que a sua porção de tapete seja a mais bonita ou vistosa. Desde sempre os forasteiros ficaram encantados com as plantas e flores da Madeira, como testemunhou Isabel de França, no seu «Jornal de uma visita à Madeira e Portugal: 1853-1854». Isabel de França ficou deslumbrada com as serras verdejantes, mas também com as giestas, trepadeiras, balsaminas, fetos, urzes, murtas, musgos, e especialmente com os jardins onde abundavam gerânios, mimos, bálsamos, acácias, rosas bravas, açucenas, jarros, madressilvas, etc. Curiosamente muitas destas flores ainda compõem os tradicionais tapetes de flores, predominando cores e cheiros. 


Os tapetes são construídos com uma largura entre os 50 cm e os 80 cm e um comprimento de centenas de metros, atingindo em algumas localidades mais de um quilómetro, sendo utilizada uma grande diversidade de materiais naturais. Na base ou cama do tapete são aplicados musgos ou verduras cortadas, como o cedro, o buxo, a urze, etc. Por cima, a contrastar com a base, são colocadas as flores, desfolhadas (“despencadas”, como diz o povo) ou inteiras, de grande diversidade formal e de intenso colorido, que estão meticulosamente arrumadas em caixas, cestos ou baldes, por cores e tonalidades. Entre muitas variedades são comummente utilizadas as hortênsias (“os novelos”), as coroas de Henrique, as dálias, as próteas, as gerberas, as rosas, os brincos-de-princesa, as sardinheiras, os não-me-deixes, ou mesmo os sapatinhos e as estrelícias, introduzidos mais recentemente. Na realização de determinados motivos, há o recurso pontual a outros materiais como a farinha, farelo ou aparas de madeira.


Os tapetes florais, em meados do século XX, em pleno Estado Novo, também foram muito empregues em acontecimentos profanos aquando da passagem de entidades governamentais. Por exemplo, a 22 de junho de 1941, na inauguração dum troço da Estrada Regional, entre os Prazeres e a Ponta do Pargo, registou-se que nesta última localidade o cortejo passou “sobre uma alcatifa de musgos” e na ponte da ribeira da Maloeira “o chão tem um tapete policromo, em que os musgos dão um piso macio. Legendas: «Viva Carmona!», «Viva Salazar», «Viva o sr. Governador Civil», «Viva a Junta Geral” e «Sêde Bemvindos»”. 



Texto: Paulo Ladeira e Rita Rodrigues
Fotografias: DRC/Paulo Ladeira, Museu Etnográfico da Madeira/Hélder Ferreira, Museu de Fotografia da Madeira – Atelier Vicente´s

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